Justa causa por atos de manifestações nas mídias sociais

A legislação trabalhista determina que a demissão por justa causa siga critérios legais específicos, permitindo que, em casos de abusos, a situação seja levada ao Judiciário e, se necessário, revertida. A relação entre empregadores e trabalhadores deve ser pautada na boa-fé objetiva e no respeito mútuo, conforme os parâmetros estabelecidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Com a popularização das redes sociais e dos aplicativos de mensagens, muitas empresas têm utilizado registros dessas plataformas para justificar a aplicação da justa causa.

O tema foi sugerido por um leitor para a coluna Prática Trabalhista, intensificando o debate sobre a aplicação desse instrumento de penalização.

Lição de especialista

Mas afinal, o que significa a justa causa no Direito do Trabalho? De acordo com os ensinamentos de Adalberto Martins e as palavras de Wagner Giglio, “a justa causa traduz-se no ato faltoso grave, praticado por uma das partes, que autorize a rescisão do contrato sem ônus para o denunciante”. Nem toda infração justifica o encerramento do contrato; é essencial que haja dolo ou culpa grave. Quando a infração é leve ou inexistente, a demissão não se sustenta, sendo preferível a aplicação de punições menos severas, como a suspensão ou advertência.

A doutrina aponta para três sistemas legislativos acerca da justa causa: o genérico, o taxativo e o exemplificativo. O consenso é de que o legislador optou pelo sistema taxativo, enumerando situações específicas que autorizam a demissão e impedindo a invocação de motivos não previstos em lei.

Legislação

De acordo com o artigo 482 da CLT, a demissão por justa causa deve observar os critérios que fundamentem o encerramento do contrato de trabalho, o que resulta na redução dos direitos do trabalhador quanto ao pagamento das verbas rescisórias.

Casos práticos

Um caso emblemático envolveu um trabalhador acusado de postar figurinhas “desrespeitosas” em um grupo corporativo de WhatsApp. Inicialmente, a demissão por justa causa foi aplicada, mas posteriormente revertida, obrigando a empresa ao pagamento das verbas rescisórias típicas de uma dispensa sem motivo. O empregado, com mais de 13 anos de serviço em uma empresa de serviços gráficos, foi demitido sob a acusação de “mau procedimento e indisciplina”.

Após uma comunicação via WhatsApp sobre o atraso no pagamento do adiantamento salarial, o trabalhador compartilhou figurinhas em um grupo que incluía o proprietário da empresa. As mensagens foram interpretadas como desrespeitosas e provocaram tumulto, o que teria justificado a adoção da medida extrema.

No julgamento, o magistrado ressaltou que “a despedida por justa causa constitui a penalidade mais severa aplicável ao trabalhador e, por isso, só deve ser admitida quando houver comprovação robusta de uma falta grave, capaz de romper definitivamente a fidúcia inerente à relação de trabalho”. O juiz também observou que outros colaboradores presentes no grupo não foram punidos, evidenciando uma aplicação seletiva da penalidade.

Esse episódio evidencia a fragilidade dos argumentos da empresa, que penalizou apenas um empregado enquanto ignorava condutas similares de outros. Dessa forma, a demissão por justa causa deve ser considerada uma medida excepcional, respaldada por provas consistentes e por comportamentos que minem a confiança estabelecida na relação de trabalho.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) já se pronunciou em situações semelhantes envolvendo publicações inadequadas em grupos de WhatsApp. Em um desses casos, um trabalhador foi dispensado por um ato que ofendeu a honra do empregador, após reclamar sobre o atraso no pagamento do 13º salário. Segundo o voto do ministro relator, embora a postagem tenha sido agressiva e reprovável, ela não configurou falta grave suficiente para justificar a demissão – especialmente considerando o longo período de serviço sem infrações e o curto tempo em que a publicação permaneceu online.

“O reclamante valeu-se de seu aplicativo de mensagens para externar seu sentimento de insatisfação com o suposto atraso do pagamento da parcela do 13º salário — a qual, na realidade, foi quitada tempestivamente. Embora a linguagem empregada denote agressividade e suscite repúdio, configurando uma conduta reprovável, ela não possui a gravidade necessária para configurar a justa causa, sobretudo considerando que o reclamante prestou serviços por oito anos sem cometer nenhuma infração disciplinar e que a publicação foi removida em poucos minutos. Não há como concluir que, após oito anos de vínculo empregatício, uma publicação mantida por poucos minutos e contendo uma reclamação acerca do atraso de uma das parcelas legais, implique na quebra absoluta da fidúcia essencial à relação de trabalho.”

Esses exemplos ressaltam a importância de cautela ao se aplicar a demissão por justa causa, considerando o grande impacto dessa medida na vida pessoal e profissional do trabalhador. As empresas devem investir na implementação de mecanismos preventivos — como registros de ocorrências, regulamentos internos e códigos de conduta — que, ao promover o cumprimento das normas e fortalecer o diálogo interno, se mostram muito mais vantajosos do que arcar com os custos decorrentes de falhas na gestão do comportamento no ambiente de trabalho.

Iboti Advogados Associados
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