Justa causa por atos de manifestações nas mídias sociais

A legislação trabalhista determina que a demissão por justa causa siga critérios legais específicos, permitindo que, em casos de abusos, a situação seja levada ao Poder Judiciário e, conforme o caso, até mesmo revertida.

O relacionamento entre empregadores e trabalhadores deve ser orientado pela boa-fé objetiva e pelo respeito mútuo, em conformidade com as normas contidas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Com a popularização das redes sociais e dos aplicativos de mensagens, muitas empresas passaram a utilizar registros dessas plataformas para justificar a aplicação da justa causa.

O tema foi sugerido por um leitor para o artigo da semana na coluna Prática Trabalhista, intensificando o debate sobre a questão.

Lição de especialista

O que significa, afinal, a justa causa no Direito do Trabalho? Conforme os ensinamentos de Adalberto Martins e as palavras de Wagner Giglio, a justa causa traduz-se no ato faltoso grave, praticado por uma das partes, que autorize a rescisão do contrato sem ônus para o denunciante.

Nem toda infração justifica a rescisão do contrato de trabalho. A justa causa caracteriza-se pelo dolo ou culpa grave. Se a infração for leve ou inexistente, a medida extrema da demissão por justa causa não se sustenta, sendo mais adequada a aplicação de punições menos severas, como suspensão ou advertência.

A doutrina aponta para três sistemas legislativos relacionados à justa causa: o genérico, o taxativo e o exemplificativo. Há consenso de que o legislador optou pelo sistema taxativo, enumerando situações específicas que justificam a demissão e impedindo a invocação de motivos não previstos em lei.

Legislação

De acordo com o artigo 482 da CLT, a demissão por justa causa deve obedecer a critérios que fundamentem o encerramento do contrato de trabalho de forma motivada, reduzindo os direitos do trabalhador durante o pagamento das verbas rescisórias.

Casos práticos

Um caso emblemático envolveu um trabalhador acusado de postar figurinhas “desrespeitosas” em um grupo corporativo de WhatsApp, cuja demissão por justa causa foi revertida. A empresa teve que arcar com o pagamento das verbas rescisórias típicas de uma dispensa sem motivo. O empregado, com mais de 13 anos de serviço em uma empresa de serviços gráficos, foi demitido sob a acusação de “mau procedimento e indisciplina”.

Após uma comunicação via WhatsApp sobre o atraso no pagamento do adiantamento salarial, o trabalhador compartilhou figurinhas no grupo, no qual também participava o proprietário da empresa. As figurinhas foram consideradas “desrespeitosas” e teriam causado tumulto, justificando a aplicação da justa causa.

No julgamento, o magistrado enfatizou que “a despedida por justa causa constitui a penalidade mais severa aplicável ao trabalhador e, por isso, só deve ser admitida quando for comprovada, de forma robusta, a ocorrência de falta grave o suficiente para romper definitivamente a fidúcia inerente ao contrato de trabalho”. O juiz ressaltou ainda que outros colaboradores presentes no grupo não foram punidos, evidenciando uma aplicação seletiva da penalidade.

O caso demonstrou a fragilidade dos argumentos da empresa, que penalizou apenas um empregado, enquanto ignorava comportamentos semelhantes de outros. Dessa forma, a demissão por justa causa deve ser uma medida excepcional, respaldada por provas consistentes e por condutas que comprometam a confiança na relação de trabalho.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) já se manifestou em situações semelhantes envolvendo publicações inadequadas em grupos de WhatsApp. Em um episódio, um trabalhador foi dispensado por ato que lesou a honra do empregador após reclamar sobre o atraso no pagamento do 13º salário. Segundo o voto do ministro relator, mesmo que a postagem tenha sido agressiva e reprovável, ela não configurou uma falta grave suficiente para justificar a demissão, especialmente considerando o longo período de serviço sem infrações e o curto tempo em que a publicação permaneceu online.

“O reclamante valeu-se de seu aplicativo de mensagens para externar seu sentimento de insatisfação com o suposto atraso do pagamento da parcela do 13º salário — a qual, na realidade, foi quitada tempestivamente. Embora a linguagem empregada denote agressividade e suscite repúdio, configurando uma conduta reprovável, ela não possui a gravidade necessária para configurar a justa causa, sobretudo considerando que o reclamante prestou serviços por oito anos sem cometer nenhuma infração disciplinar e que a publicação foi removida em poucos minutos. Não há como concluir que, após oito anos de vínculo empregatício, uma publicação mantida por poucos minutos e contendo uma reclamação acerca do atraso de uma das parcelas legais, implique na quebra absoluta da fidúcia essencial à relação de trabalho.”

Esses exemplos ressaltam a importância da cautela na aplicação da demissão por justa causa, considerando a gravidade da medida para a vida pessoal e profissional do trabalhador. É fundamental que as empresas adotem medidas preventivas, estabelecendo regras claras, investindo em capacitação e treinamentos que garantam o cumprimento das normas e fortaleçam o diálogo interno.

A implementação de mecanismos complementares, como registros de ocorrências, regulamentos internos e códigos de conduta, é uma estratégia eficaz para prevenir danos, demonstrando que investir em prevenção é muito mais vantajoso do que arcar com os custos decorrentes de falhas na gestão do comportamento no ambiente de trabalho.

Iboti Advogados Associados
assessoria-juridica

Enfrentando algum problema jurídico e buscando orientação?

2025
Motorista bloqueado?
Podemos ajudar

Converse com um advogado